O Pacifista Book Cover O Pacifista
John Boyne
Ficção Histórica
Companhia das Letras
2012
302
O Pacifista — John Boyne 1

Inglaterra, setembro de 1919. Tristan Sadler, vinte e um anos, toma o trem de Londres a Norwich para entregar algumas cartas à irmã mais velha de William Bancroft, soldado com quem combateu na Grande Guerra. As cartas, porém, não são o verdadeiro motivo da viagem de Tristan. Ele já não suporta o peso de um segredo que carrega no fundo de sua alma, e está desesperado para se livrar desse fardo, revelando tudo a Marian Bancroft. Resta saber se o antigo combatente terá coragem para tanto. Enquanto reconta os detalhes sombrios de uma guerra que para ele perdeu o sentido, Tristan fala também de sua amizade com Will, desde o campo de treinamento em Aldershot, onde se encontraram pela primeira vez, até o período que passaram juntos nas trincheiras do norte da França.

Quando me perguntam “qual seu gênero literário favorito”, a minha vontade é responder: John Boyne falando de guerra. Esse é o quarto livro que leio desse “gênero” e o quarto livro que me encanta completamente. O Pacifista é um romance, diferente de O menino do pijama listrado, o menino no alto da montanha fique onde está e então corra, que são livros infanto-juvenis do autor.

O Pacifista começa com Tristan, um editor de livros, em viagem à Norwich em 1919 para encontrar-se com a Marian Bancroft, irmã de seu amigo Will. E então prossegue alternando capítulos com narrativas do presente, durante a estadia de Tristan em Norwich e narrativas do passado (também relatadas na primeira pessoa e no presente). Essa alternância, além de demarcada no início do capítulo com contextualização geográfica e temporal, é bem marcada pelo conteúdo dos capítulos, visto que os capítulos do passado concentram-se no relato de Tristan sobre seus dias durante o treinamento militar e durante a primeira guerra mundial. Então ela realmente não incomoda pessoas que, como eu, já sentem uma preguiça incauculável ao notar alternâncias de qualquer forma.

Em Norwich, acompanhamos o encontro de Tristan com Marian e, conforme ele conta a ela as histórias de seus anos no exército ao lado de seu irmão, somos levados aos capítulos dessas passagens, acompanhando como que em tempo real o que ele relata de suas memórias. Conhecemos, nessas frações do passado, a rotina de treinamento, seus os colegas de regimento e superiores e a dificuldade da vida durante os conflitos, acompanhando Tristan em um trincheira literalmente no meio da guerra. Enquanto conhecemos mais sobre Tristan, Will e seus colegas, somos apresentados a Wolf, um jovem recruta que se recusa a praticar qualquer forma de violência. Em tempos de guerra, claramente isso enfurece os superiores, então assistimos também as punições que Wolf sofre e o tanto de sua ideologia é transferida — mesmo que involuntariamente — para alguns dos outros recrutas.

Como se o conflito ideológico sobre os benefícios e malefícios que a guerra trazia (e traria) ao país, e os riscos de apresentar uma oposição ao clima combatente instaurado em todo o país, não fosse conflito o suficiente para sustentar uma narrativa, Boyne derruba outra crise em cima do leitor quando deixa claro o sentimento amoroso que Tristan desenvolve por Will. E nesse momento eu amei um pouquinho mais John Boyne.

Apesar disso ter sido uma surpresa super positiva durante a leitura, não consigo escrever essa resenha sem mencionar esse fato porque, sinceramente, isso deixa o livro ainda mais rico e diferente de tantos outros livros sobre as grandes guerras.

Resumo da ópera? John Boyne + Guerra, não tem como não amar. É sempre a minha receita favorita pra lavar aquela ressaca literária depois de um livro mais pesado ou daquele livro incrível que te vira do avesso. (No caso, li esse depois de “O que o inferno não é”, mas acabei deixando a resenha pra depois e só saiu agora). O tema tem essa aura pesada, inerente às guerras, mas a escrita leve de Boyne balanceia maravilhosamente a descrição suficiente para imaginar o cenário e a angústia do personagem, sem sobrecarregar ou cansar o leitor. Ele sabe dosar a angústia — arrisco dizer que necessária quando tratamos desse assunto — sem pesar ao ponto de tornar o livro um fardo emocional para o leitor. Sua narrativa é rápida, traz elementos que fogem do senso comum e que conseguem, sei lá eu como, fazer com que o leitor se relacione com a história em um nível pessoal e, ao mesmo tempo, tornar a experiência de leitura de um livro de guerra leve.