Eu costumava escrever. Cartas. Disfarçadas de crônicas, como se alguém se enganasse que aquela dor não era minha. Eu sentia o coração sangrar e tinha orgulho, escancarava o peito e deixava ele ali, se debatendo e a dor fluindo pelo corpo todo e saindo em forma de palavras. Estranhamente, eu gostava daquilo. Gostava do que saia de mim. Lembro que quando lia tudo de novo, não parecia que tinha vindo daqui de dentro.
Eu lembro qual foi a última vez que escrevi.
Lembro porque, 4 anos atrás, o coração aquietou-se, cheio de um amor que não mais o feria.
Eu gostava de escrever. Gostava das minhas palavras e de como as enfileirava, uma puxando a outra. Então tentei uma, duas, três vezes. Escrevi coisa ou outra, sobre nada. Não tinha dor pra falar e, sobre felicidade, escrevia parágrafos inteiros na minha cabeça, mas ocupada que estava amando, não havia tempo para registrá-los em lugar algum e acabavam se perdendo.
Hoje, quando tudo dói de novo, eu me encolho em mim, tentando sufocar o coração que antes ganhava espaço quando doía. Mas acho que com o tempo, passei a temer a dor.
Não é pra menos. Quatro anos atrás eu não tinha tantas preocupações ou responsabilidades, e eu podia sentir o que quisesse na hora que quisesse. Agora? Agora eu não posso interromper uma reunião de trabalho porque uma memória me esmurrou o estômago. E as ondas reprimidas vêm mais forte nos momentos em que sou tudo o que tenho.
Talvez eu volte a escrever.
Respostas de 4
Texto que dá uma saudadinha boa, Ana. Eu também já fui de escrever bastante, em quantidade e não necessariamente qualidade. Hoje ainda escrevo, menos do que gostaria, mas mantenho a escrita em dia e talvez o blog seja o meu despertador. É muito legal quando surge uma ideia de repente, no meu do dia, mas é uma pena quando não dá para anotar e a rotina chama. Mas não é possível parar de escrever quando já se começou alguma vez, um dia as memórias chegam com força integral.
Escreva sim, Ana, escreva sempre.
Que bom que você consegue manter a escrita em dia! Eu sempre tentei incluir isso na minha rotina diária, mas realmente tem dias que nada sai.
E aí sempre tem esses dias em que as ideias aparecem do nada e vão embora antes que a gente consiga registrar em algum lugar :~
E você tem razão! Realmente acredito que não é possível parar de escrever depois que a gente descobre o que palavras conseguem alcançar dentro da gente. <3
É engraçado como os textos sempre parecem fluir melhor na tristeza, né? As palavras ficam mais encorpadas, tem um gosto mais temperado quando saem da boca, a gente termina um texto e se sente meio bêbado. É bom fazer isso de vez em quando, mas é um problema quando a gente descobre que só consegue escrever quando tá na bad.
Demais, Cela. Parece que as palavras ficam menos abstratas quando estamos passando por um momento difícil. É muito bom sentir um peso se aliviando dentro da gente depois de escrever, mesmo que seja pra escrever sem filtro nenhum e só deixar tudo fluir pra fora.
Tem um haiku de um dos meus autores favoritos que eu sempre anoto na primeira página de todo caderno que resolvo usar de rascunho pras coisas que é extremamente verdadeiro:
“I finally understand
that I do not write
I leak”